IDR-Paraná dá assistência a quilombolas em Adrianópolis 04/09/2024 - 16:45
No Paraná existem 39 comunidades quilombolas certificadas pela Fundação Palmares. O IDR-Paraná presta assistência a essa população, com o objetivo de levar alternativas de produção e políticas públicas que possam melhorar as condições de vida dessas famílias. O município de Adrianópolis concentra o maior número de comunidades quilombolas no Paraná e os extensionistas acompanham a implantação do cultivo de frutas, cana-de-açúcar e café, culturas que podem mudar a realidade econômica e social dessas comunidades.
De acordo com o extensionista Eduardo Coelho, do IDR-Paraná, umas das atividades econômicas mais estabelecidas nas comunidades quilombolas em Adrianópolis é o cultivo de banana, com certificação orgânica. A atividade tem baixo custo e boa remuneração para os produtores. O cultivo de banana orgânica ocupa três hectares no quilombo João Surá, mas a expectativa é dobrar a área. A produção chega a duas toneladas por mês, no verão e é vendida para clientes de Curitiba e Região Metropolitana. “Estamos trabalhando a análise do solo, adubação preventiva e corretiva e manejo das áreas de plantio”, explicou Coelho. Ele informou que o interesse pelo cultivo da banana orgânica surgiu pela diferença de preço do produto pago ao produtor. Enquanto a caixa, de 20 kg, de banana convencional é vendida a R$15, a banana orgânica chega a ser comercializada, em média, por R$ 90,00 a caixa. “Apesar de a região ser protegida dos ventos, que podem trazer doenças, ocasionalmente surgem alguns problemas nos bananais. Por isso, estamos incentivando o uso de biofertilizantes. Em parceria com o Sebrae estamos instalando cinco unidades piloto para produzir micro-organismos que serão usados nos bananais”, acrescentou o extensionista. Os biofertilizantes fortalecem a planta e diminuem o ataque ou os danos das doenças. Coelho disse ainda que os produtores estão sendo orientados a buscar novos canais de comercialização, como a Ceasa de Curitiba.
Cana
Outra alternativa econômica para os quilombolas de Adrianópolis tem sido a cana-de-açúcar, já que o litoral do Paraná e de Santa Catarina, além de Curitiba, têm uma grande demanda para o consumo do caldo. Adrianópolis tem se destacado como principal produtor de cana-de-açúcar para este segmento. Os quilombolas do município mantinham cultivos de cana para alimentar os animais, porém o aumento da procura e valorização do produto despertaram o interesse em vender a cana para terceiros. Atualmente são quatro hectares de cana, com uma produção semanal de dez toneladas. “Todo trabalho é braçal, já que as áreas são declivosas e dificultam o uso de maquinário. A cana é vendida por R$25 o feixe e o atravessador vende para carrinhos de caldo. O ganho dos quilombolas poderia ser maior se eles vendessem a cana já raspada. Para isso, eles precisam ter um local refrigerado para conservar o produto, já que a cana raspada resiste no máximo três dias”, explicou Coelho. Agora, os quilombolas estão tentando viabilizar a aquisição de uma câmara fria.
Café com história
Neste ano o IDR-Paraná está incentivando a produção de café dentro dos territórios quilombolas. Mais que produzir, os extensionistas querem identificar a qualidade da produção. Existem mais de 300 cafeeiros produzindo nas comunidades quilombolas, no entanto toda a produção é consumida apenas pela comunidade. Uma amostra desse café foi enviada para análise, no Norte do Paraná, e os resultados foram promissores. Tudo leva a crer que os quilombolas de Adrianópolis poderão produzir um café gourmet em breve. De acordo com Eduardo Coelho, os pés de café que estão nessas comunidades se originam de plantas trazidas pelos escravizados que fugiram das antigas fazendas, há duzentos anos. “O café é cultivado sombreado, numa área de seis hectares no quilombo João Surá. Só precisamos ajustar o manejo do cultivo, melhorar o sistema de colheita e secagem dos grãos para colocar no mercado um café com história”, ressaltou o extensionista. Na próxima colheita serão selecionadas 2.000 sementes para a produção de mudas, ampliando a área com café no quilombo. Em cinco anos, espera-se que os quilombolas formem micro-lotes que serão colocados à venda no mercado. No dia 29 deste mês, o IDR-Paraná promoveu uma oficina com moradores do quilombo João Surá, para que eles conhecessem detalhes técnicos dos processos de colheita e secagem do café para aumentar a qualidade do produto.
Mamão e maracujá
No ano passado foram implantadas quatro unidades-piloto de produção de mamão no quilombo João Surá. Como a região está sujeita à ocorrência da doença conhecida como pinta-preta, os quilombolas foram orientados pelo extensionista a usar calda bordalesa, o que evitou prejuízos. A boa produtividade, em média 10 quilos por pé, levou os produtores quilombolas a ampliarem a área em dez unidades. Hoje são 1.500 pés produzindo e o destino das frutas já foi acertado com compradores de Curitiba.
O maracujá também faz parte do cardápio de frutas produzidas pelos produtores das comunidades quilombolas João Surá e Sete Barras. Atualmente são aproximadamente 1.000 pés da fruta, mas a intenção dos produtores é aumentar o cultivo. A produção é vendida in natura nas feiras da região, além de abastecer o mercado regional com polpa e licores
Todas essas iniciativas, de acordo com Eduardo Coelho, são formas de garantir uma renda para os produtores quilombolas. Muitas dessas comunidades têm dificuldade de irrigar as lavouras, só contam com o trabalho braçal para arar e plantar a terra. Além disso, o acesso às comunidades não é fácil. O quilombo João Surá, por exemplo, fica a 65 km da sede do município de Adrianópolis, o que significa uma hora e meia de percurso, por estrada sem asfalto. “Essas famílias são atendidas pelo CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), mas queremos que elas saiam dessa situação de carência, com a implantação de culturas perenes para que possam aumentar sua renda. Muitos jovens dos quilombos não conseguem ver perspectiva de futuro vivendo nas suas comunidades. Apesar de terem terra, muitos deles preferem se mudar para a cidade e trabalhar como empregados. Nosso trabalho é tentar mudar essa realidade, reverter esse êxodo”, concluiu Coelho.
De acordo com Laís Adamuchio de Oliveira, coordenadora de projetos do IDR-Paraná na região de Curitiba, a implantação dessas culturas em Adrianópolis tem uma justificativa. Segundo ela, o município tem um clima tropical o que propicia o desenvolvimento das frutas de clima mais quente. Outra vantagem é a proximidade de Curitiba que concentra um grande mercado consumidor. “A atuação com cadeias tropicais vem ao encontro dessa demanda de mercado, sendo uma excelente oportunidade não somente para os quilombolas, como também para todos os agricultores familiares de Adrianópolis”, afirmou. Laís acrescentou ainda que os extensionistas do IDR-Paraná têm atuado de forma estratégica para fortalecer as organizações rurais, principalmente a CAFA (Cooperativa da Agricultura Familiar de Adrianópolis) que tem um grande número de quilombolas no seu quadro de associados.
Quilombo
A palavra quilombo se origina do termo kilombo, presente no idioma dos povos Bantu, originários de Angola, e significa local de pouso ou acampamento. No Brasil colonial
a palavra foi adaptada para designar o local de refúgio dos escravizados fugitivos. A origem em comum dos remanescentes de quilombos é a ancestralidade africana de negros escravizados que fugiram da crueldade da escravidão e refugiaram-se nas matas. Com o passar do tempo, vários desses fugitivos aglomeravam-se em determinados locais, formando tribos. Mais adiante, brancos, índios e mestiços também passaram a habitar os quilombos, somando, porém, menor número da população.
Os quilombos não eram isolados, mas quase sempre estavam localizados em regiões de difícil acesso. Apesar do isolamento, os quilombolas mantinham contato com comunidades vizinhas, estabeleciam comércio e também eram avisados sobre a presença de elementos que buscavam foragidos. Os quilombolas plantavam e viviam da pesca. Muitos reproduziam sistemas aprendidos nos tempos em que moravam na África. Boa parte da cultura que se formou naquele período é reproduzida em quilombos até hoje. Foi a partir da Constituição de 1988 que os quilombolas tiveram seus direitos reconhecidos no país, sobretudo o da posse da terra que ocupavam.. Atualmente há um esforço para recuperar seus territórios, reconhecer a importância cultural e histórica das comunidades quilombolas, bem como preservar esse patrimônio.